O
Soldado convalescente e o Major mandão
Era uma vez, uma tropa (tropa é pejorativo,
mas segue a história...) que viajou para “Salvador - Bahia, território africano,
baiano sou eu, é você...” com o fito de trabalhar no Carnaval, tendo por missão o
intento de servir e proteger a sociedade. Os soldados quando se formam fazem juramento de "defender a sociedade mesmo com o risco da própria vida", já já conto que no caso
de hoje foi com risco da própria vida mesmo! Os oficiais, “seres superiores”
(apenas no plano funcional, pois os seres humanos são iguais em direitos e
obrigações, pelo menos no “dever ser” e fora das muralhas dos quartéis), fazem
um juramento diferente, de cumprir as missões inerentes ao oficialato, mas não
juram defender quem quer que seja com o risco da própria vida (bom pra eles!).
Pois sim, o folião se diverte, dança “lepo
lepo” e a PM garante a segurança, dentro das possibilidades e limitações que
possui. O valor da hora de trabalho do PM é baixo, cerca de 15 reais, o lanche
nem sempre é bom (não se pensa por exemplo no diabético ou no hipertenso,
refrigerante, sucos com açúcar e conservantes!), as escalas exorbitantes, os
alojamentos ruins, muitas pessoas por metro quadrado, calor, gente chegando a
toda hora, uns saindo outros chegando de serviço.
Mesmo assim, diante de todas essas
consternações tudo seguia normal, ou quase, na Piedade, até que um jovem
Policial começa a passar mal. Primeiras horas da terça-feira, dia 04 de março.
Os PMs eram comandados por um certo Major mandão, que informado sobre a
dificuldade do Policial, recomendou apenas que o mesmo descansasse, “relaxasse”.
Tempos depois, o PM vai ao posto médico e constata que sua pressão arterial
estava alta, muito alta. Então, a política é manter o descanso, com o passar
mal seguido, nova ida ao socorro médico, e o Policial continua a passar mal.
Dessa vez, existe um atestado dizendo “repouso absoluto”. Entra em cena o Major
mandão, que de forma contundente não atendeu aos clamorosos pedidos de sua “trooopa”
para que o adoecido regressasse à Vila Militar, onde estava alojado
(pessimamente alojado)para cumprir o repouso absoluto recomendado pelo atestado
médico.
Tudo bem que o Policial, praça, defende a
sociedade mesmo com o risco da própria vida, mas no caso, não precisava tanto,
não precisava permanecer no posto policial aguardando a condução que levaria os
seus pares, quando do término do serviço. Os Comandados não acolheram a “determinação”
do Major mandão. Foram solidários, não tendo autorização para que a viatura
conduzisse o colega convalescente, juntaram dinheiro, parte do que receberam
pelo honroso serviço do carnaval, e pagaram um taxi. Isso mesmo, “vaquinha”
para um taxi que levasse o adoecido até o alojamento, para uma tentativa de
repouso absoluto num lugar que acomoda
dezenas de homens. O vídeo no “bocaonews” e em tantos blogs, sites e nas redes
sociais dão conta dessa lastimável passagem da vida do Policial.
Mas essa história não acabará mal para o
Soldado. Ora, um Coronel Humanizado, cristão talvez, acolheu o adoecido em seu
lar, oferecendo-lhe tratamento digno. O mesmo oficial, mais polido, pediu ainda
que todas as testemunhas fossem ouvidas em termo, para que dissessem tudo que o
Major mandão mandou.
Os Praças unidos triunfaram, o PM foi
socorrido e conduzido para repouso, graças à ação coletiva, pois se fosse pelo
mandão, o Soldado esperaria o ônibus e retornaria junto com os demais. O
revanchismo tem de acabar. A superioridade dos que mandam é apenas funcional,
muitos dos mandões poucos estudaram na vida, o nível superior de alguns é o
curso da academia, bacharelado em Segurança Pública. Esse mandado que escreve é
bacharel em Direito, especialista em Direito Público e Privado, Mestre em
Cultura e Turismo, está professor universitário, está Soldado da Polícia
Militar, só um por exemplo, para dizer que os mandões são superiores no plano
funcional apenas dentro da instituição.
Agora, 17 horas do dia 05 de março o Soldado
passa bem. Sua esposa irá em instantes encontrá-lo. A entidade que o Policial é
filiado, Aspra, acompanhou as oitivas das testemunhas, que já assinalam que o
mandão mandou, mas mandou errado. Tudo será apurado. Vai ver que é por isso que
o cantor diz na música que, “Atenção! Sentido! Não faz sentido” (O exército de
um homem só – Engenheiros do Hawaii). É o militarismo um limitarismo? De
repente sim... o legislativo um dia vai confirmar o que a sociedade já diz, e
que os PMs timidamente tentam dizer.
Lima, estamos com você!
“Alô Estado! Não quero ir ao carnaval
trabalhar e ainda assim ser muito mal tratado”. Salário mais digno. Alojamento
mais digno. Alimentação mais digna. Tratamento mais digno. Para não dizer que
não falei das flores: “Mais humanismo, menos militarismo”.
Rodrigo Eduardo Rocha Cardoso
Soldado da Polícia Militar (PMBA)
Coordenador da ASPRA BAHIA - Regional
Itabuna
Professor Universitário (FTC - Itabuna)
Bacharel em Direito (FTC)
Especialista em Direito Público e
Privado (FTC)
Mestre em Cultura e Turismo (UESC)